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terça-feira, 15 de julho de 2014

Genética e Bioinformática se encontram nas fronteiras da Imunologia

A elucidação dos mecanismos envolvidos na geração da variabilidade de anticorpos e TCRs representa uma das maiores conquistas da imunologia. Enquanto a variabilidade dos MHCs é dada pelo elevado polimorfismo na região cromossômica que codifica estas moléculas (6p21.3, em humanos), a variabilidade de TCRs e imunoglobulinas (IGs) é dada por um complexo mecanismo genético envolvendo a recombinação de segmentos variáveis identificados pelas letras V (variable), D (diversity) e J (joining). Estes mecanismos foram esclarecidos ao logo das décadas de 80 e 90 [1,2,3,4], um período de ouro para a imunogenética e que coincide com o primeiro momento de crescimento no número de publicações em bioinformática (Figura 1).
                                                                                                               
Figura 1. Número de publicações no PubMed com os termos "immunogenetics" e "bioinformatics" entre os anos de 1965 e 1998. O pico observado para as publicações em imunogenética com ápice em 1971 se refere a elucidação do papel do antígeno H no sistema ABO [5,6,7], enquanto a aparente queda nas publicações a partir de 1975 pode refletir o maior enfoque dado as avaliações funcionais (após a descrição dos anticorpos monoclonais). O terceiro pico, em 1981, se refere as publicações sobre o sistema V-D-J [1,2]. As publicações em bioinformática continuaram crescendo até estabilizar entre 2012 e 2013 (anos nos quais foram registradas 16.302 e 16.009 publicações com este termo, respectivamente).


Neste período efervescente para a imunogenética e a bioinformática, foi criado na França o IMGT (the international ImMunoGeneTics information system)[8,9]. Segundo uma recente publicação da revista Frontiers in Immunology [9], a criação deste banco - especializado em genes e proteínas de interesse da imunologia - marcaria o nascimento da "Imunoinformática". A proposta do IMGT se diferencia de outros repositórios de dados biológicos justamente por sua preocupação em fornecer o tratamento adequado da informação envolvida na variabilidade de IGs, TCRs e MHCs. Ele foi desenvolvido sobre um conjunto de axiomas e conceitos (IMGT-ONTOLOGY), para permitir a correlação entre sequências gênicas, sequências proteicas e as estruturas destas moléculas complexas (Figura 2).

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Figura 2. Acima, estrutura de uma imunoglobulina (IG), molécula central na resposta imunológica humoral. A direita, representação de um complexo TCR/peptídeo:MHC, elemento chave na montagem das respostas imunológicas celulares. Figuras publicadas por Marie-Paule Lefranc (2014) [9], na revista Frontiers in Immunology.

Atualmente o IMGT compreende um total de sete bancos, com mais de 15.000 páginas de recursos online e 17 ferramentas, fornecendo ainda um sistema para a análise de dados genômicos e de expressão para IGs e TCRs. O IMGT fornece ferramentas como IMGT/Collier-de-Perles tool, o qual permite criar representações didáticas das moléculas de interesse do usuário, seguindo o padrão de numeração e nomenclatura desenvolvido pelo IMGT. Esta é uma alternativa muito interessante para o estudo dos diferentes polimorfismos nas moléculas de MHC. Outra ferramenta de destaque é o IMGT/V-QUEST, que permite a análise de sequências nucleotídicas dos domínios variáveis de IGs e TCRs, sendo capaz de identificar os genes V, D e J nas sequências rearranjadas das moléculas estudadas pelo usuário. Além disso, no caso de IGs, a ferramenta consegue identificar as mutações nucleotídicas e as consequentes trocas de aminoácidos oriundas do processo de hipermutação somática, através da comparação com dados de referência do próprio IMGT/V-QUEST. 

Figura 3. Número de publicações no PubMed com os termos "immunoinformatics","reverse vaccinology" e "computational vaccinology", entre os anos de 1998 e 2013.
Sendo um tema central para a imunologia, a vacinologia sempre esteve presente nas discussões em imunoinformática. O termo "vacinologia reversa" foi cunhado em 2000 pelo italiano Rino Rappuoli [10], para se referir a um processo de desenvolvimento de vacinas que se iniciava pela análise de sequências genômicas in silico, seguido pela identificação de alvos e posterior expressão de proteínas recombinantes para testes in vivo. Esta estratégia continua sendo discutida e aplicada, acumulando uma série de resultados interessantes na imunização contra vírus e bactérias [11,12,13]. Mais recentemente começou a se popularizar o termo "vacinologia computacional", que também tem sido discutida como uma alternativa na pesquisa em câncer [14,15]. Independentemente do termo mais utilizado (ou mais adequado), o fato é que o uso de ferramentas computacionais para o desenvolvimento de vacinas é uma realidade que vem ganhando força (Figura 3), sobretudo graças ao crescimento da comunidade de bioinformatas interessados em imunologia e a rápida evolução dos recursos computacionais.

Post de Dinler Amaral Antunes
NBLI - Núcleo de Bioinformática do Laboratório de Imunogenética.
Aluno de Doutorado do Programa de Pós-Graduação em Genética e Biologia Molecular da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (PPGBM/UFRGS).

Nota: 
Agradeço ao professor José Artur Bogo Chies (Laboratório de Imunogenética/UFRGS) pelo suporte na pesquisa sobre Imunogenética.

Referências:
1. Kurosawa Y, von Boehmer H, Haas W, Sakano H, Trauneker A, et al. (1981) Identification of D segments of immunoglobulin heavy-chain genes and their rearrangement in T lymphocytes. Nature 290: 565-570.
2. Maki R, Roeder W, Traunecker A, Sidman C, Wabl M, et al. (1981) The role of DNA rearrangement and alternative RNA processing in the expression of immunoglobulin delta genes. Cell 24: 353-365.
3. Schatz DG, Oettinger MA, Schlissel MS (1992) V(D)J recombination: molecular biology and regulation. Annu Rev Immunol 10: 359-383.
4. Fanning L, Bertrand FE, Steinberg C, Wu GE (1998) Molecular mechanisms involved in receptor editing at the Ig heavy chain locus. Int Immunol 10: 241-246.
5. Sanger R, Race RR (1971) Immunogenetics of certain antigens of the red cell membrane. Nouv Rev Fr Hematol 11: 878-884.
6. Salmon C (1971) [Immunogenetics of ABH antigens]. Nouv Rev Fr Hematol 11: 850-862.
7. Petrov RV (1971) [Current problems of immunogenetics]. Zh Mikrobiol Epidemiol Immunobiol 48: 7-12.
8. Giudicelli V, Chaume D, Bodmer J, Muller W, Busin C, et al. (1997) IMGT, the international ImMunoGeneTics database. Nucleic Acids Res 25: 206-211.
9. Lefranc MP (2014) Immunoglobulin and T Cell Receptor Genes: IMGT((R)) and the Birth and Rise of Immunoinformatics. Front Immunol 5: 22.
10. Rappuoli R (2000) Reverse vaccinology. Curr Opin Microbiol 3: 445-450.
11. Vivona S, Gardy JL, Ramachandran S, Brinkman FS, Raghava GP, et al. (2008) Computer-aided biotechnology: from immuno-informatics to reverse vaccinology. Trends Biotechnol 26: 190-200.
12. Donati C, Rappuoli R (2013) Reverse vaccinology in the 21st century: improvements over the original design. Ann N Y Acad Sci 1285: 115-132.
13. Delany I, Rappuoli R, Seib KL (2013) Vaccines, reverse vaccinology, and bacterial pathogenesis. Cold Spring Harb Perspect Med 3: a012476.
14. Pappalardo F, Chiacchio F, Motta S (2013) Cancer vaccines: state of the art of the computational modeling approaches. Biomed Res Int 2013: 106407.
15. Petrizzo A, Tagliamonte M, Tornesello M, Buonaguro FM, Buonaguro L (2014) Systems vaccinology for cancer vaccine development. Expert Rev Vaccines 13: 711-719.

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